quinta-feira, 27 de novembro de 2008

A Classe Operária e o Neomalthusianismo

V. I. Lênin
29 de Junho de 1913
No congresso médico, realizado no Instituto Pirogov, despertou grande interesse e suscitou inúmeras discussões, a questão do aborto provocado. O relator, Lickus, citou dados referentes à grande difusão dos abortos provocados, nos dias de hoje, nos países que se dizem civilizados.
Em New York verificaram-se em um ano 80 mil abortos provocados; na França, 36 mil por mês. Em Petersburgo a percentagem dos abortos provocados aumentou em mais do dobro no espaço de cinco anos.
Segunda o parecer do congresso médico, o aborto, não deveria ter jamais, para a mãe, conseqüências penais e o médico só deveria ser punido por lei quando agisse «por interesse».
A maior parte dos médicos que negaram a punibilidade do aborto, naturalmente levantou, também, no curso dos debates, a questão do chamado neomalthusianismo(1*) (isto é, das práticas preventivas) e a esse respeito, também, tocou-se no lado, social da questão. Assim, por exemplo, segundo o noticiário do Russkoie Slovo(2*), o Sr. Vigdorick declarou que «é necessário saudar os sistemas preventivos», enquanto o Sr. Astrakhan exclamou entre uma tempestade de aplausos:
«Devemos convencer as mães a ter filhos, para que sejam estropiados nas escolas, para que sejam induzidos ao suicídio segundo sorteio!».
Se é verdade, como se disse, que essas declarações da Sr. Astrakhan provocaram uma tempestade de aplausos, não me surpreendo em absoluto. Os presentes eram burgueses, pequenos e médios, com mentalidade pequeno-burguesa. Que se podia esperar deles, se não o mais chão liberalismo?
Mas se se examina o problema segundo o ponto de vista da classe operária, é quase impossível encontrar prova mais clamorosa do caráter absolutamente reacionário e da inconsistência do «neomalthusianismo social» do que a frase do Sr. Astrakhan por nós citada.
«Ter filhos para que sejam estropiados». . . Apenas para isto? E não para que lutem melhor, mais unidos, com maior consciência e energia que nós contra as atuais condições de vida que estropiam e arrumam a nossa geração?
Nisso reside a diferença entre a mentalidade do camponês, do artesão, do intelectual e a do proletário. O pequeno-burguês vê e sente que está caminhando para a ruína, que a vida se torna mais difícil, que a luta pela existência se torna sempre mais cruel, que sua situação e a de sua família se tornam cada vez mais sem saída. É um fato incontestável, contra o qual o pequeno-burguês protesta.
Mas, como protesta?
Protesta, humilhado e tímido, como representante de uma classe que se precipita, sem esperança, para sua própria ruína, que não tem nenhuma confiança no próprio futuro. Nada se pode fazer, senão ter menos filhos para sofrer os nossos tormentos, para arrastar os nossos grilhões, para suportar nossa miséria e nossa humilhação: esse é o grito do pequeno-burguês.
O operário consciente está a mil milhas de distância desse modo de ver. Não deixa sua consciência embotar-se por tais elementos, por mais sinceros e profundamente sentidos que sejam eles. Sim, também nós, operários e a massa dos pequenos proprietários, estamos curvados sob um jugo insuportável e nossa vida está cheia de sofrimentos. Nessa geração tem uma vida mais dura que a de nossos pais. Mas, sob certo aspecto, somos muito mais felizes do que eles. Aprendemos e estamos aprendendo rapidamente a lutar; e a lutar, não sozinhos, como os melhores dentre nossos pais; não em nome das palavras de ordem de charlatães burgueses, que nos são estranhas, que não sentimos, mas em nome de palavras de ordem nossas, de nossa classe. Lutamos melhor que nossos pais. Nossos filhos lutarão ainda melhor e vencerão.
A classe operária não se precipita para a ruína, mas cresce, torna-se mais forte e mais viril, torna-se compacta, educa-se e tempera-se no combate. Somos pessimistas quanto, à sorte do feudalismo, do capitalismo e da pequena produção, mas otimistas e cheios de entusiasmo no que se refere ao movimento operário e à sua meta. Já lançamos os alicerces do novo edifício e nossos filhos o terminarão.
Eis a razão, a única razão, par que somos decididamente inimigos do neomalthusianismo, dessa tendência própria dos casais pequeno-burgueses, que, em sua mesquinhez e egoísmo, murmuram assustados: se Deus quiser, viveremos nós dois de qualquer modo; quanto aos filhos, é melhor não os ter.
Isso, naturalmente, não os impede de exigir a revogação de todas as leis que proíbem o aborto ou proíbem a difusão dos preceitos médicos referentes aos métodos preventivos etc. Tais leis não passam de uma hipocrisia das classes dominantes. Tais leis não curam a moléstia do capitalismo, mas as tornam particularmente malignas e graves para as massas oprimidas. Uma coisa são a liberdade da propaganda médica e a defesa dos direitos democráticos fundamentais para os cidadãos de ambos os sexos; outra, a doutrina social do neomalthusianismo. Os operários conscientes travarão sempre a luta mais encarniçada contra as tentativas de impor essa doutrina vil e reacionária à classe que é, na sociedade atual, a mais avançada, a mais forte, a mais preparada para as grandes transformações.

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