m) As Eleições. O Encerramento do Congresso.
Depois da aprovação dos estatutos, o congresso adotou uma resolução sobre as organizações regionais, várias resoluções relativas a diferentes organizações do partido, e depois de debates extremamente instrutivos sobre o grupo Iújni rabótchi, cuja análise fiz anteriormente, o congresso passou à questão das eleições para 05 organismos centrais do partido.
Sabemos já que a organização do Iskra, de quem todo o congresso esperava ra uma recomendação autorizada, se tinha dividido neste ponto, querendo a minoria da organização tentar no congresso, através de uma luta livre e aberta, conquistar a maioria. Sabemos também que, muito antes do congresso, todos os delegados tinham tomado conhecimento do plano de renovaçãoda redação pela eleição de dois grupos de três para o OC e o CC. Detenhamo-nos neste plano mais pormenorizadamente para esclarecer os debates no congresso.
Eis aqui o texto exato do meu comentário ao projeto de Tagesordnung do congresso, em que foi exposto este plano* : "O congresso elegerá três pessoas para a redação do OC e outras três para o CC. Estas seis pessoas em conjunto, por maioria de 2/3 se necessário, completarão a redação do OC e o CC por cooptação, e apresentam ao congresso o relatório correspondente. Depois da aprovação deste relatório pelo congresso, a cooptação posterior far-se-á separadamente pela redação do OC e pelo CC."
Deste texto o plano ressalta com uma precisão perfeita e sem o mínimo equívoco: ele significa a renovação da redação com a participação dos mais influentes dirigentes do trabalho prático. Os dois aspectos que assinalei neste plano são imediatamente evidentes para quem se der ao trabalho de ler com alguma atenção o texto citado. Mas nos tempos que correm devemos determo-nos a explicar mesmo as coisas mais elementares. O plano significa justamente a renovação da redação, e não necessariamente que se amplie ou se reduza o número dos seus membros, mas precisamente que se renove, ficando em aberto a questão de um possível alargamento ou redução; a cooptação é prevista apenas para os casos em que for necessária. Entre as hipóteses emitidas por diversas pessoas sobre a questão desta renovação havia também planos de redução ou aumento possível do número de membros da redação para sete membros (pela minha parte considerei sempre que sete era muito mais conveniente que seis), e até o aumento deste número para onze membros (coisa que eu considerava possível no caso de uma união pacífica com todas as organizações sociais-democratas em geral, com o Bund e a social-democracia polaca em particular). Mas o mais importante que normalmente esquecem os que falam do "grupo de três", é que se exige que os membros do CC participem na solução da questão relativa a cooptação posterior para o OC. Nem um só camarada entre todos os membros da organização e delegados da "minoria" do congresso que conheciam este plano e o aprovaram (exprimindo o seu acordo ou de maneira explícita ou pelo seu silêncio) se deu ao trabalho de explicar o significado desta exigência. Primeiro: porque se tinha adotado como ponto de partida da renovação da redação precisamente um grupo de três e só um grupo de três? E evidente que isso careceria em absoluto de sentido se se visasse exclusivamente, ou pelo menos principalmente, ampliar esse organismo coletivo, se tal organismo coletivo fosse considerado verdadeiramente "harmonioso". Seria estranho que para ampliar um organismo coletivo "harmonioso" não se partisse do seu conjunto, mas apenas de uma parte dele. Sem dúvida que nem todos os membros desse organismo coletivo eram considerados inteira mente aptos para discutir e resolver o problema da renovação da sua composição pessoal, da transformação do velho círculo redatorial num organismo do partido. E evidente que mesmo quem pessoalmente desejasse a renovação sob a forma de ampliação reconhecia que a antiga composição não era harmoniosa, que não correspondia ao ideal de um organismo do partido, porque, de outro modo, não havia razão para começar por reduzir o grupo de seis a um grupo de três para o ampliar. Repito: isto é evidente por si só, e apenas um obscurecimento momentâneo da questão por questões "pessoais" o pôde fazer esquecer.
Em segundo lugar, do texto antes citado ressalta que mesmo o acordo dos três membros do OC ainda não bastaria para ampliar o grupo de três. Também isto é sempre esquecido. Para a cooptação são precisos 2/3 de seis, ou seja, quatro votos; por isso bastaria que os três membros eleitos para o CC opusessem o seu "veto" para tornar impossível qualquer ampliação do grupo de três. Pelo contrário, mesmo se dois dos três membros da redação do OC fossem contra a cooptação posterior, esta poderia mesmo assim efetivar-se se os três membros do CC lhe tivessem dado o seu acordo. E evidente desta maneira que se pretendia, ao transformar o velho círculo em organismo do partido, dar voz decisiva aos dirigentes do trabalho prático eleitos pelo congresso. Quais eram, aproximadamente, os camaradas que tínhamos em mente, mostra-o o fato de a redação, antes do congresso, ter eleito por unanimidade como sétimo membro o camarada Pavlóvitch, para o caso de ser necessário falar no congresso em nome do nosso organismo coletivo; além do camarada Pavlóvitch, propôs-se para o lugar do sétimo um velho membro da organização do Iskra e membro do CO, mais tarde eleito membro do CC205.
Assim, o plano de eleição de dois grupos de três visava manifestamente:
1) renovar a redação, 2) eliminar nela certos aspectos do velho espírito de círculo, inadequado num organismo do partido (se não houvesse nada a eliminar, não teríamos tido que inventar o grupo de três inicial!), e por fim 3) eliminar os traços "teocráticos" de um organismo de literatos (eliminação a realizar fazendo com que destacados militantes práticos intervenham para resolver a questão da ampliação do grupo de três). Este plano, do qual todos os redatores tinham sido informados, assentava evidentemente na experiência de três anos de trabalho e correspondia completamente aos princípios que pusemos em prática consequentemente em matéria de organização revolucionária: na época de dispersão em que apareceu o Iskra, muitas vezes se constituíam grupos de modo fortuito e espontâneo, sofrendo inevitavelmente de certas manifestações nefastas do espírito de círculo. A criação do partido implicava e exigia a eliminação destes aspectos; a participação de destacados militantes práticos nesta eliminação era imprescindível, já que nos membros da redação se tinham ocupado sempre de questões de organização, e não era apenas um organismo de literatos que devia entrar no sistema dos organismos do partido, mas sim um organismo de dirigentes políticos. O fato de ter deixado ao congresso a tarefa de eleger o grupo de três inicial, era igualmente natural do ponto de vista da política desde sempre defendida pelo Iskra: preparamos o congresso com extremo cuidado, esperando que fossem plenamente esclarecidas as questões de princípio controversas, do programa, da táctica e da organização; não duvidávamos que o congresso seria um congresso iskrista no sentido de que a imensa maioria se solidarizaria nestas questões fundamentais (o que em parte demonstravam também as resoluções sobre o reconhecimento do Iskra como órgão dirigente); tínhamos pois que deixar aos camaradas sobre cujos ombros tinha pesado todo o trabalho de difusão das idéias do Iskra e de preparação da sua transformação em partido decidirem eles próprios quem eram os candidatos competentes para o novo organismo do partido. E unicamente pelo caráter natural do plano dos "dois grupos de três", unicamente pela sua plena conformidade com toda a política do Iskra e com tudo o que sabiam dela os que tivessem a mais pequena relação com o trabalho, que se pode explicar a aprovação geral deste plano e a ausência de qualquer outro plano concorrente.
E eis que no congresso o camarada Rússov propõe, antes de mais, que se elejam os dois grupos de três. Os partidários de Mártov, que nos tinha informado por escrito da relação deste plano com a falsa acusação de oportunismo, nem sequer pensaram, todavia, em reduzir a discussão sobre o grupo de seis e o grupo de três à questão de saber se esta acusação era fundada ou não. Nem um deles o mencionou sequer! Nem um deles ousou dizer uma só palavra sobre a diferença de princípio dos matizes ligados ao grupo de seis e ao grupo de três. Preferiram um meio mais corrente e mais barato: apelar para a piedade, falar de um possível ressentimento, fingir que o problema da redação estava já resolvido com a designação do Iskra como Orgão Central. Este último argumento, utilizado pelo camarada Koltsov contra o camarada Rússov, é manifestamente falso. Na ordem do dia do congresso figuravam - e não acidentalmente, é claro - dois pontos especiais (ver p. 10 das atas): p. 4- "O OC do partido" e p. 18- "A eleíçao do CC e da redação do OC". Isto, em primeiro lugar. Em segundo lugar, ao designar o OC, todos os delegados declararam categoricamente que com isso não se confirmava a redação, mas apenas a orientação* , e nenhum protesto se levantou contra estas declarações.
Assim, a declaração de que depois de ter confirmado um órgão determinado o congresso tinha de fato confirmado desse modo a redação -declaração muitas vezes repetida pelos partidários da minoria (Koltsov, p. 321, Possadóvski, ibid., Popov, p. 322, e muitos outros) -, era simplesmente de fato falsa. Era uma manobra evidente para todos, a qual mascarava o abandono da posição tomada quando todos ainda podiam de modo verdadeiramente imparcial encarar o problema da composição dos centros. Não era possível justificar o abandono, nem por razões de principio (porque levantar no congresso a questão da "falsa acusação de oportunismo" seria demasiado desvantajoso para a minoria, a qual não disse uma só palavra a esse respeito), nem por uma referência a fatos concretos sobre a verdadeira capacidade de trabalho do grupo de seis ou do grupo de três (porque a simples referência a estes fatos teria fornecido uma montanha de provas contra a minoria). Tiveram que escapar-se, portanto, com frases sobre "o todo harmonioso", "coletividade harmoniosa", sobre "a harmonia e a integridade cristalina do todo", etc. Não é de espantar que imediatamente se tenham chamado tais argumentos pelo seu verdadeiro nome:" palavras mesquinhas" (p. 328). O próprio plano do grupo de três testemunhava claramente falta "de harmonia", e as impressões recolhidas pelos delegados no decorrer de mais de um mês de trabalho em comum forneceram sem dúvida aos delegados uma grande quantidade de dados para que pudessem julgar de modo independente. Quando o camarada Possadóvski fez alusão (de maneira imprudente e irrefletida do seu ponto de vista: ver pp. 321 e 325 sobre o emprego "condicional" que ele fez da palavra "fricções") a estes dados, o camarada Muraviov declarou francamente: "Na minha opinião, é agora completamente claro para a maioria do congresso que tais fricções* existem indubitavelmente" (p. 321). A minoria quis compreender a palavra fricções (lançada por Possadóvski e não por Muraviov) exclusivamente no sentido de algo pessoal, não ousando levantar a luva lançada pelo camarada Muraviov, não ousando formular um único argumento que na realidade servisse para a defesa do grupo de seis. Gerou-se uma discussão arquicômica pela sua esterilidade: a maioria (pela boca do camarada Muraviov), declara ver com toda a clareza o verdadeiro significado do grupo de seis e do grupo de três, enquanto a minoria persiste em não ouvir e afirma que "não temos a possibilidade de fazer essa análise". A maioria não só considera possível fazer essa análise, como já "a fez" e fala dos resultados para ela perfeitamente claros dessa análise, enquanto a minoria, pelos vistos, reeia essa análise, escudando-se unicamente nas "palavras mesquinhas". A maioria recomenda "que se tenha em conta que o nosso OC não é apenas um grupo de literatos"; a maioria "quer que à cabeça do OC estejam pessoas perfeitamente determinadas, conhecidas do congresso, que preencham as exigências de que falei" (isto é, exigências não apenas literárias, p. 327, discurso do camarada Langue). Ainda desta vez, a minoria não ousa levantar a luva e não diz nem uma única palavra sobre quem, na sua opinião, pode fazer parte de um organismo coletivo que não seja apenas literário, nem diz quem é uma pessoa "perfeitamente determinada e conhecida do congresso". A minoria continua a entricheirar-se por trás da famosa "harmonia". Mais ainda. A minoria serve-se mesmo de argumentos que são absolutamente falsos em princípio, e que por isso provocam, muito justamente, uma resposta violenta. "O congresso - vejam só - não tem o direito, nem moral nem política, de modificar a redação" (Trótski, p. 326), "é uma questão demasiado delicada (sic!)" (ibid.) "como devem comportar-se os membros não eleitos da redação perante o fato de o congresso não querer que eles façam mais parte da redação?" (Tsariov, p. 324)*4.
Tais argumentos remetiam já a questão inteiramente para o campo da piedade e do ressentimento, sendo um reconhecimento manifesto da bancarrota no terreno dos argumentos verdadeiramente de princípio, verdadeiramente políticos. E a maioria definiu imediatamente esta maneira de pôr o problema pelo seu verdadeiro nome: filistinismo (camarada Rússov). "Na boca de revolucionários - disse justamente o camarada Rússov - ouvimos singulares discursos que estão em evidente desacordo com o conceito de trabalho de partido, de ética de partido. O argumento essencial que os adversários da eleição dos grupos de três formulam reduz-se a um ponto de vista puramente filistino sobre os assuntos do partido" (todos os sublinha dos são meus)... "colocando-nos neste ponto de vista que não é de partido e sim filistino, em cada eleição iremos encontrar-nos perante a questão de saber se Petrov se não ofenderia vendo que em vez dele foi eleito Ivanov, se determinado membro do CO se não ofenderia vendo que em vez dele foi eleito outro para o CC. Camaradas, onde é que isto nos vai levar? Se nos reunimos aqui não para nos obsequiarmos mutuamente com agradáveis discursos ou trocarmos amabilidades filistinas, mas para criar um partido, não podemos de maneira nenhuma estar de acordo com esse ponto de vista. Trata-se de eleger funcionários e não pode colocar-se a questão de falta de confiança em nenhum dos não eleitos, mas apenas do bem da causa e de que a pessoa eleita seja adequada para o cargo para que é designada" (p. 325).
Aconselharíamos todos os que querem entender por si próprios as causas da cisão do partido e chegar às suas raízes no congresso que leiam e releiam o discurso do camarada Rússov, cujos argumentos a minoria não refutou, como nem sequer os pôs em dúvida. Aliás é impossível contestar verdades tão elementares e primárias, cujo esquecimento tão justamente explicou o próprio camarada Rússov só por "excitação nervosa". E para a minoria esta é efetivamente a explicação menos desagradável de como eles tinham podido abandonar o ponto de vista de partido para passar a um ponto de vista filistino e de círculo*5.
Mas a minoria estava a tal ponto impossibilitada de encontrar argumentos razoáveis e sérios contra as eleições que, para além de introduzir espírito filistino nos assuntos do partido, chegou a métodos de caráter francamente escandaloso. De fato, como não chamar assim ao método utilizado pelo camarada Popov, que aconselhou o camarada Muraviov "a não aceitar encargos delicados" (p. 322)? Que é isto senão querer "introduzir-se na consciência alheia", segundo a justa expressão do camarada Sorókine (p. 328)? Que é isto senão especular sobre "questões pessoais" à falta de argumentos políticos? Ao afirmar que "sempre protestamos contra tais meios", o camarada Sorókine tinha ou não razão? "Será admissível a conduta do camarada Deutsch, que procurou de maneira ostensiva pôr no pelourinho os camaradas que não estavam de acordo com ele?"*6 (p. 328).
Façamos o balanço dos debates sobre a questão relativa à redação. A minoria não refutou (nem tentou refutar) as numerosas indicações da maioria sobre o fato de que os delegados conheciam o projeto do grupo de três desde a abertura do congresso e antes do congresso e de que, por consequência, esse projeto se baseava em considerações e dados independentes dos acontecimentos e discussões do congresso. A minoria, ao assumir a defesa do grupo de seis, tomava uma posição inadmissível e errada quanto aos princípios baseada em considerações filistinas. A minoria mostrou ter esquecido completamente o ponto de vista de partido quanto à escolha dos funcionários, sem procurar sequer fazer uma apreciação de cada candidato para um cargo, da sua adequação ou não adequação às funções desse cargo. A minoria furtou-se ao exame da questão a fundo, invocando a famosa harmonia, "vertendo lágrimas", "tomando atitudes patéticas" (p. 327, discurso de Langue), como se "se quisesse matar" alguém. A minoria chegou mesmo a "introduzir-se na consciência alheia", a gritar que as eleições eram "criminosas", a usar de outros meios igualmente inadmissíveis, sob a influência da "excitação nervosa" (p. 325).
A luta do espírito filistino contra o espírito de partido, das "questões pessoais" do pior gosto contra as considerações políticas, das palavras mesquinhas contra os conceitos mais elementares do dever revolucionário, eis o que foi a luta à volta do grupo de seis e do grupo de três na trigésima sessao do nosso congresso.
E na 31.ª sessão, quando, por maioria de 19 votos contra 17 e três abstenções, o congresso rejeitou a proposta para confirmação do conjunto da antiga redação (ver p. 330 e a errata), e quando os antigos redatores voltaram para a sala das sessões, o camarada Mártov, na sua "declaração em nome da maioria da antiga redação" (pp. 330-33 1), deu provas, em proporções ainda maiores, das vacilações e da mesma instabilidade da posição política e das concepções políticas. Examinemos em pormenor cada um dos pontos da declaração coletiva e da minha resposta (pp. 332-333) a esta declaração.
"A partir de agora - diz o camarada Mártov depois da não confirmação da antiga redação - o velho Iskra já não existe, e seria mais lógico mudar-lhe o nome. De qualquer maneira, vemos na nova decisão do congresso uma restrição substancial do voto de confiança dado ao Iskra numa das primeiras sessoes do congresso."
O camarada Mártov, com os seus colegas, levanta uma questão, verdadeiramente interessante e instrutiva sob muitos aspectos, sobre a coerência política. Já lhe respondi ao invocar aquilo que todos tinham dito quando da confirmação do Iskra (p. 349 das atas, cf. acima, p. 82)*7. E indubitável que estamos na presença de um dos mais gritantes exemplos de falta de consequência em política. Da parte de quem? Da parte da maioria do congresso ou da maioria da antiga redação, deixamos ao leitor o cuidado de julgar. E ainda ao leitor que deixamos o cuidado de decidir de duas outras questões postas muito a propósito pelo camarada Mártov e pelos seus colegas: 1) é um ponto de vista filistino ou um ponto de vista de partido que revela o desejo de ver "uma restrição do voto de confiança ao Iskra" na decisão do congresso de proceder à eleição dos funcionários para a redação do OC? 2) a partir de que momento deixa realmente de existir o velho "Iskra" ? A partir do n.0 46, quando Plekhánov e eu começamos ambos a dirigi-lo, ou a partir do n.0 53, quando a maioria da antiga redação se colocou à cabeça dele? Se a primeira questão é uma questão de princípio das mais interessantes, pelo contrário a segunda é uma questão de fato das mais interessantes.
"Como se decidiu agora - prossegue o camarada Mártov - eleger uma redação de três pessoas, eu declaro em meu nome e em nome dos meus outros três camaradas que nenhum de nós fará parte dessa nova redação. Pela minha parte, acrescentarei que, se é exato que alguns camaradas quiseram inscrever o meu nome como um dos candidatos a esse "grupo de três", vejo-me obrigado a ver nisso uma ofensa que não merecia (sic!). Digo isto em virtude das circunstâncias em que se decidiu alterar a redação.
Decidiu-se isso por causa de certas "fricções"*8, da incapacidade para atuar da antiga redação, e o congresso resolveu essa questão num determinado sentido, sem nada perguntar à redação sobre essas fricções e sem nomear sequer uma comissão para pôr a claro isso da sua incapacidade para atuar"... (O estranho é que a ninguém da minoria ocorreu propor ao congresso que "perguntasse à redação" ou nomeasse uma comissão! Não seria porque, depois da cisão da organização do Iskra e do fracasso das conversações sobre as quais escreveram os camaradas Mártov e Starover, isso teria sido inútil?)... "Nestas circunstâncias, devo considerar a hipótese de certos camaradas de que eu aceitaria trabalhar na redação reformada desta maneira como uma mancha na minha reputação política"...*9
Foi propositadamente que reproduzi na íntegra este raciocínio, para apresentar ao leitor uma amostra e o ponto de partida do que floresceu com tanta abundância depois do congresso e que não podemos qualificar de outro modo senão como querela mesquinha. Já empreguei esta expressão na minha Carta à Redação do "Iskra" e, apesar do descontentamento da redação, sou obrigado a repeti-la pela sua exatidão incontestável. E errado crer-se que tais querelas implicam "motivos baixos" (como conclui a redação do novo lskra): qualquer revolucionário minimamente familiarizado com as nossas colónias de exilados e emigrados certamente pôde ver dezenas de exemplos destas querelas, em que se colocavam e examinavam até à sociedade as mais absurdas acusações, suspeitas, auto-acusações, questões "pessoais", etc., querelas provocadas pela "excitação nervosa" e condições de vida anormais, bafientas. Não há um só homem sensato que se ponha a procurar a todo o custo motivos baixos nestas querelas, por mais baixas que se iam as suas manifestações. E é apenas por uma "excitação nervosa" que se pode explicar esta meada emaranhada de absurdos, de questões pessoais, de horrores fantásticos, de penetrações na consciência alheia, de ofensas e de calúnias imaginárias que nos oferece o excerto que reproduzi do discurso do camarada Mártov. As condições de vida bafientas geram entre nós centenas destas querelas, e um partido político não mereceria consideração se não ousasse dar o seu verdadeiro nome à doença de que sofre, fazer um diagnóstico implacável e procurar o meio de cura.
Na medida em que se pode distinguir nesta meada algo de princípio, tem de se chegar inevitavelmente à conclusão de que "as eleições nada têm de comum com uma ofensa à reputação política", que "negar o direito do congresso de proceder a novas eleições, de introduzir qualquer modificação nos quadros de funcionários, de selecionar os componentes dos organismos aos quais outorga poderes", significa embrulhar a questão, e que "o ponto de vista do camarada Mártov segundo o qual podia eleger-se parte do antigo organismo revela uma enorme confusão de conceitos políticos" (como disse no congresso, p. 332)*10.
Omito a observação "pessoal" do camarada Mártov relativa à questão de saber quem teve a iniciativa do plano do grupo de três e passo à caracterização "política" do significado que ele deu à não confirmação da antiga redação:... "O que se passou agora é o último ato da luta que se desenrolou durante a segunda metade do congresso"... (Muito bem! e esta segunda metade começa no momento em que Mártov, a propósito do § 1 dos estatutos, caiu no apertado abraço do camarada Akímov)... "Não é segredo para ninguém que, quanto a esta reforma, não se trata de "capacidade para atuar", mas de uma luta pela influência sobre o CC"... (Em primeiro lugar, não e segredo para ninguém que se tratava tanto da capacidade para atuar como de uma divergência sobre a composição pessoal do CC, visto que o plano de "reforma" foi apresentado quando ainda não se podia falar da segunda divergência e quando, em conjunto com o camarada Mártov, tínhamos escolhido como sétimo membro da redação o camarada Pavló vitch! Em segundo lugar, já mostramos, apoiados em documentos, que se tratava da composição pessoal do CC, e que à la fin des fins *11 o problema se reduziu a uma diferença de listas: Glébov—Travínski—Popov e Glébov—Trótski—Popov)... "A maioria da redação mostrou que não queria ver transformado o CC num instrumento da redação"... (Começa a cantilena de Akimov: a questão da influência, pela qual luta qualquer maioria, em qualquer congresso de partido, sempre e em todo o lado, a fim de consolidar esta influência por uma maioria nos organismos centrais, passa para o domínio dos mexericos oportunistas sobre o "instrumento" da redação, sobre "um simples apêndice" da redação, como disse o próprio camarada Mártov um pouco mais tarde, p. 334.) ... "E por isso que foi preciso reduzir o número de membros da redação (!!). E é por isso que não posso fazer parte de tal redação"... (Vejam só com mais atenção este "e é por isso que": como poderia a redação transformar o CC num apêndice ou num instrumento? Exclusivamente no caso de ter três votos no Conselho e abusar desta superioridade? Não é claro? E não será também claro que o camarada Mártov, eleito terceiro membro, poderia sempre impedir qualquer abuso e eliminar apenas com o seu voto qualquer superioridade da redação no Conselho? A questão reduz-se, pois, precisamente, à composição pessoal do CC, e desde logo fica bem claro que isso de instrumento e apêndice são meros mexericos.)... "Em conjunto com a maioria da antiga redação, eu pensava que o congresso poria fim ao "estado de sítio" no seio do partido e instalaria nele um regime normal. Na prática, o estado de sítio com as suas leis de exceção contra certos grupos foi prolongado e até se agravou. Só se se mantiver a composição da antiga redação podemos garantir que os direitos conferidos à redação pelos estatutos não serão utilizados em prejuízo do partido"...
Esta é a passagem integral do discurso do camarada Mártov em que lançou pela primeira vez a famigerada palavra de ordem do "estado de sítio". E agora vede a minha resposta:
..."Ao corrigir a declaração de Mártov sobre o caráter particular do plano dos dois grupos de três, nem sequer penso, no entanto, em opor-me ao que o próprio Mártov diz sobre o "significado político" da iniciativa que tomamos não confirmando a antiga redação. Pelo contrário, estou inteira mente e sem restrições de acordo com o camarada Mártov em que esta decisão tem grande importância política, mas não no sentido que lhe atribui Mártov. Este é, disse ele, um ato da luta pela influência no CC na Rússia. Eu vou mais longe do que Mártov. Toda a atividade do Iskra enquanto grupo particular foi até agora uma luta pela influência, mas agora trata-se de algo mais, trata-se de consolidar organicamente esta influência e não só de lutar por ela. A profundidade da nossa divergência política com o camarada Mártov sobre este ponto manifesta-se claramente quando ele me lança à cara este desejo de exercer influência no CC, ao passo que eu me prezo de ter procurado e de continuar a procurar consolidar esta influência através da organização. Verifica-se que até falamos linguagens diferentes. De que servi ria todo o nosso trabalho, todos os nossos esforços, se viessem a ser coroados pela mesma velha luta pela influência, e não pela plena aquisição e consolidação da influência? Sim, o camarada Mártov tem toda a razão: o passo dado é incontestavelmente um grande passo político, que prova que foi escolhida uma das tendências que atualmente se nos apresentam para o trabalho futuro do nosso partido. E não estou nada assustado com as palavras terríveis sobre o "estado de sítio no Partido", sobre as "leis de exceção contra certas pessoas ou certos grupos", etc. Para os elementos instáveis e hesitantes não somente podemos, mas devemos, criar o "estado de sítio" , e os nossos estatutos na sua totalidade, todo o nosso centralismo a partir de agora aprovado pelo congresso, tudo isso mais não é do que um "estado de sítio" contra as fontes tão numerosas de imprecisão política. Contra a imprecisão necessitamos justamente de leis especiais, ainda que sejam de exceção, e o passo dado pelo congresso indicou a direção política justa, dando uma base sólida a tais leis e a tais medidas."*12
Sublinhei neste resumo do meu discurso no congresso a frase que o camarada Mártov preferiu omitir no seu "Estado de Sitio" (p. 16). Não admira que esta frase lhe tenha desagradado e que não tenha querido compreender o seu sentido bem claro.
Que significa a expressão "palavras terríveis", camarada Mártov?
Significa troçar, troçar dos que dão grandes nomes a coisas pequenas, que embrulham uma questão simples com uma fraseologia pretensiosa.
O único, pequeno e simples fato que pôde servir e serviu de pretexto à"excitação nervosa" do camarada Mártov consistia exclusivamente no fato de o camarada Mártov ter sofrido uma derrota no congresso, na questão relativa à composição pessoal dos centros, O significado político deste simples fato foi que a maioria do congresso do partido, depois de ter triunfado, consolidou a sua influência estabelecendo também a maioria na direção do partido, lançando, no terreno da organização, uma base para a luta, por meio dos estatutos, contra aquilo que essa maioria considerava hesitação, instabilidade e imprecisão*13. Falar a propósito disto de "luta pela influência" com uma espécie de horror no olhar e queixar-se do "estado de sítio" era apenas fraseologia pretensiosa, apenas palavras terríveis.
O camarada Mártov não está de acordo com isto? Porque não tenta demonstrar-nos se houve no mundo um congresso de partido, se é concebível em geral um congresso de partido em que a maioria não consolidou a influência conquistada: 1) estabelecendo a mesma maioria nos centros; 2) dando-lhe poder para neutralizar a hesitação, a instabilidade e a imprecisão?
Antes das eleições, o nosso congresso tinha de resolver a questão: era à maioria ou à minoria do partido que se devia reservar um terço dos votos no OC e no CC? O grupo de seis e a Lista do camarada Mártov significavam que o terço nos cabia a nós e os dois terços aos seus partidários. O grupo de três no OC e a nossa lista significavam que dois terços eram para nós, e um terço para os partidários do camarada Mártov. O camarada Mártov recusou-se a chegar a um acordo conosco ou a ceder, e provocou-nos para o combate, por escrito, diante do congresso; mas depois de ter sofrido a derrota perante o congresso, pôs-se a chorar e começou a queixar-se do "estado de sítio"! Ora não será isto uma querela mesquinha? Não será isto uma nova manifestação de tibieza própria de intelectuais?
Não podemos deixar de recordar a propósito a brilhante definição sociopsicológica desta última qualidade dada recentemente por K. Kautsky. Os partidos sociais-democratas de diferentes países estão atualmente sujei tos muitas vezes a doenças do mesmo gênero, e ser-nos-á muito, muito útil aprender com camaradas mais experientes o diagnóstico justo e o trata mento acertado. Por isso, a definição de alguns intelectuais dada por Kautsky só na aparência nos afastará do nosso tema.
... "No momento atual, de novo nos interessamos vivamente pela questão do antagonismo entre os intelectuais*14 e o proletariado. Os meus colegas" (Kautsky é também um intelectual, literato e redator) "em muitos casos indignar-se-ão ao ver que eu admiro este antagonismo. Mas o fato é que ele existe, e a táctica mais inadequada seria (neste como noutros casos) tentar desembaraçarmo-nos dele negando o fato. Este antagonismo é um antagonismo social que se manifesta nas classes e não em indivíduos isolados. Tal como um capitalista, um intelectual pode, individualmente, entregar-se por inteiro à luta de classe do proletariado. Em tais casos, quando isto tem lugar,o intelectual muda também de caráter. No que vou dizer a seguir, não tratarei principalmente dos intelectuais deste tipo, que ainda hoje são exceção no seio da sua classe. A seguir, quando não houver qualquer reserva especial, entendo por intelectual apenas um intelectual comum que se situa no terreno da sociedade burguesa, e que e um representante característico da intelectualidade como classe. Esta classe mantém-se num certo antagonismo com o proletariado.
Depois da aprovação dos estatutos, o congresso adotou uma resolução sobre as organizações regionais, várias resoluções relativas a diferentes organizações do partido, e depois de debates extremamente instrutivos sobre o grupo Iújni rabótchi, cuja análise fiz anteriormente, o congresso passou à questão das eleições para 05 organismos centrais do partido.
Sabemos já que a organização do Iskra, de quem todo o congresso esperava ra uma recomendação autorizada, se tinha dividido neste ponto, querendo a minoria da organização tentar no congresso, através de uma luta livre e aberta, conquistar a maioria. Sabemos também que, muito antes do congresso, todos os delegados tinham tomado conhecimento do plano de renovaçãoda redação pela eleição de dois grupos de três para o OC e o CC. Detenhamo-nos neste plano mais pormenorizadamente para esclarecer os debates no congresso.
Eis aqui o texto exato do meu comentário ao projeto de Tagesordnung do congresso, em que foi exposto este plano* : "O congresso elegerá três pessoas para a redação do OC e outras três para o CC. Estas seis pessoas em conjunto, por maioria de 2/3 se necessário, completarão a redação do OC e o CC por cooptação, e apresentam ao congresso o relatório correspondente. Depois da aprovação deste relatório pelo congresso, a cooptação posterior far-se-á separadamente pela redação do OC e pelo CC."
Deste texto o plano ressalta com uma precisão perfeita e sem o mínimo equívoco: ele significa a renovação da redação com a participação dos mais influentes dirigentes do trabalho prático. Os dois aspectos que assinalei neste plano são imediatamente evidentes para quem se der ao trabalho de ler com alguma atenção o texto citado. Mas nos tempos que correm devemos determo-nos a explicar mesmo as coisas mais elementares. O plano significa justamente a renovação da redação, e não necessariamente que se amplie ou se reduza o número dos seus membros, mas precisamente que se renove, ficando em aberto a questão de um possível alargamento ou redução; a cooptação é prevista apenas para os casos em que for necessária. Entre as hipóteses emitidas por diversas pessoas sobre a questão desta renovação havia também planos de redução ou aumento possível do número de membros da redação para sete membros (pela minha parte considerei sempre que sete era muito mais conveniente que seis), e até o aumento deste número para onze membros (coisa que eu considerava possível no caso de uma união pacífica com todas as organizações sociais-democratas em geral, com o Bund e a social-democracia polaca em particular). Mas o mais importante que normalmente esquecem os que falam do "grupo de três", é que se exige que os membros do CC participem na solução da questão relativa a cooptação posterior para o OC. Nem um só camarada entre todos os membros da organização e delegados da "minoria" do congresso que conheciam este plano e o aprovaram (exprimindo o seu acordo ou de maneira explícita ou pelo seu silêncio) se deu ao trabalho de explicar o significado desta exigência. Primeiro: porque se tinha adotado como ponto de partida da renovação da redação precisamente um grupo de três e só um grupo de três? E evidente que isso careceria em absoluto de sentido se se visasse exclusivamente, ou pelo menos principalmente, ampliar esse organismo coletivo, se tal organismo coletivo fosse considerado verdadeiramente "harmonioso". Seria estranho que para ampliar um organismo coletivo "harmonioso" não se partisse do seu conjunto, mas apenas de uma parte dele. Sem dúvida que nem todos os membros desse organismo coletivo eram considerados inteira mente aptos para discutir e resolver o problema da renovação da sua composição pessoal, da transformação do velho círculo redatorial num organismo do partido. E evidente que mesmo quem pessoalmente desejasse a renovação sob a forma de ampliação reconhecia que a antiga composição não era harmoniosa, que não correspondia ao ideal de um organismo do partido, porque, de outro modo, não havia razão para começar por reduzir o grupo de seis a um grupo de três para o ampliar. Repito: isto é evidente por si só, e apenas um obscurecimento momentâneo da questão por questões "pessoais" o pôde fazer esquecer.
Em segundo lugar, do texto antes citado ressalta que mesmo o acordo dos três membros do OC ainda não bastaria para ampliar o grupo de três. Também isto é sempre esquecido. Para a cooptação são precisos 2/3 de seis, ou seja, quatro votos; por isso bastaria que os três membros eleitos para o CC opusessem o seu "veto" para tornar impossível qualquer ampliação do grupo de três. Pelo contrário, mesmo se dois dos três membros da redação do OC fossem contra a cooptação posterior, esta poderia mesmo assim efetivar-se se os três membros do CC lhe tivessem dado o seu acordo. E evidente desta maneira que se pretendia, ao transformar o velho círculo em organismo do partido, dar voz decisiva aos dirigentes do trabalho prático eleitos pelo congresso. Quais eram, aproximadamente, os camaradas que tínhamos em mente, mostra-o o fato de a redação, antes do congresso, ter eleito por unanimidade como sétimo membro o camarada Pavlóvitch, para o caso de ser necessário falar no congresso em nome do nosso organismo coletivo; além do camarada Pavlóvitch, propôs-se para o lugar do sétimo um velho membro da organização do Iskra e membro do CO, mais tarde eleito membro do CC205.
Assim, o plano de eleição de dois grupos de três visava manifestamente:
1) renovar a redação, 2) eliminar nela certos aspectos do velho espírito de círculo, inadequado num organismo do partido (se não houvesse nada a eliminar, não teríamos tido que inventar o grupo de três inicial!), e por fim 3) eliminar os traços "teocráticos" de um organismo de literatos (eliminação a realizar fazendo com que destacados militantes práticos intervenham para resolver a questão da ampliação do grupo de três). Este plano, do qual todos os redatores tinham sido informados, assentava evidentemente na experiência de três anos de trabalho e correspondia completamente aos princípios que pusemos em prática consequentemente em matéria de organização revolucionária: na época de dispersão em que apareceu o Iskra, muitas vezes se constituíam grupos de modo fortuito e espontâneo, sofrendo inevitavelmente de certas manifestações nefastas do espírito de círculo. A criação do partido implicava e exigia a eliminação destes aspectos; a participação de destacados militantes práticos nesta eliminação era imprescindível, já que nos membros da redação se tinham ocupado sempre de questões de organização, e não era apenas um organismo de literatos que devia entrar no sistema dos organismos do partido, mas sim um organismo de dirigentes políticos. O fato de ter deixado ao congresso a tarefa de eleger o grupo de três inicial, era igualmente natural do ponto de vista da política desde sempre defendida pelo Iskra: preparamos o congresso com extremo cuidado, esperando que fossem plenamente esclarecidas as questões de princípio controversas, do programa, da táctica e da organização; não duvidávamos que o congresso seria um congresso iskrista no sentido de que a imensa maioria se solidarizaria nestas questões fundamentais (o que em parte demonstravam também as resoluções sobre o reconhecimento do Iskra como órgão dirigente); tínhamos pois que deixar aos camaradas sobre cujos ombros tinha pesado todo o trabalho de difusão das idéias do Iskra e de preparação da sua transformação em partido decidirem eles próprios quem eram os candidatos competentes para o novo organismo do partido. E unicamente pelo caráter natural do plano dos "dois grupos de três", unicamente pela sua plena conformidade com toda a política do Iskra e com tudo o que sabiam dela os que tivessem a mais pequena relação com o trabalho, que se pode explicar a aprovação geral deste plano e a ausência de qualquer outro plano concorrente.
E eis que no congresso o camarada Rússov propõe, antes de mais, que se elejam os dois grupos de três. Os partidários de Mártov, que nos tinha informado por escrito da relação deste plano com a falsa acusação de oportunismo, nem sequer pensaram, todavia, em reduzir a discussão sobre o grupo de seis e o grupo de três à questão de saber se esta acusação era fundada ou não. Nem um deles o mencionou sequer! Nem um deles ousou dizer uma só palavra sobre a diferença de princípio dos matizes ligados ao grupo de seis e ao grupo de três. Preferiram um meio mais corrente e mais barato: apelar para a piedade, falar de um possível ressentimento, fingir que o problema da redação estava já resolvido com a designação do Iskra como Orgão Central. Este último argumento, utilizado pelo camarada Koltsov contra o camarada Rússov, é manifestamente falso. Na ordem do dia do congresso figuravam - e não acidentalmente, é claro - dois pontos especiais (ver p. 10 das atas): p. 4- "O OC do partido" e p. 18- "A eleíçao do CC e da redação do OC". Isto, em primeiro lugar. Em segundo lugar, ao designar o OC, todos os delegados declararam categoricamente que com isso não se confirmava a redação, mas apenas a orientação* , e nenhum protesto se levantou contra estas declarações.
Assim, a declaração de que depois de ter confirmado um órgão determinado o congresso tinha de fato confirmado desse modo a redação -declaração muitas vezes repetida pelos partidários da minoria (Koltsov, p. 321, Possadóvski, ibid., Popov, p. 322, e muitos outros) -, era simplesmente de fato falsa. Era uma manobra evidente para todos, a qual mascarava o abandono da posição tomada quando todos ainda podiam de modo verdadeiramente imparcial encarar o problema da composição dos centros. Não era possível justificar o abandono, nem por razões de principio (porque levantar no congresso a questão da "falsa acusação de oportunismo" seria demasiado desvantajoso para a minoria, a qual não disse uma só palavra a esse respeito), nem por uma referência a fatos concretos sobre a verdadeira capacidade de trabalho do grupo de seis ou do grupo de três (porque a simples referência a estes fatos teria fornecido uma montanha de provas contra a minoria). Tiveram que escapar-se, portanto, com frases sobre "o todo harmonioso", "coletividade harmoniosa", sobre "a harmonia e a integridade cristalina do todo", etc. Não é de espantar que imediatamente se tenham chamado tais argumentos pelo seu verdadeiro nome:" palavras mesquinhas" (p. 328). O próprio plano do grupo de três testemunhava claramente falta "de harmonia", e as impressões recolhidas pelos delegados no decorrer de mais de um mês de trabalho em comum forneceram sem dúvida aos delegados uma grande quantidade de dados para que pudessem julgar de modo independente. Quando o camarada Possadóvski fez alusão (de maneira imprudente e irrefletida do seu ponto de vista: ver pp. 321 e 325 sobre o emprego "condicional" que ele fez da palavra "fricções") a estes dados, o camarada Muraviov declarou francamente: "Na minha opinião, é agora completamente claro para a maioria do congresso que tais fricções* existem indubitavelmente" (p. 321). A minoria quis compreender a palavra fricções (lançada por Possadóvski e não por Muraviov) exclusivamente no sentido de algo pessoal, não ousando levantar a luva lançada pelo camarada Muraviov, não ousando formular um único argumento que na realidade servisse para a defesa do grupo de seis. Gerou-se uma discussão arquicômica pela sua esterilidade: a maioria (pela boca do camarada Muraviov), declara ver com toda a clareza o verdadeiro significado do grupo de seis e do grupo de três, enquanto a minoria persiste em não ouvir e afirma que "não temos a possibilidade de fazer essa análise". A maioria não só considera possível fazer essa análise, como já "a fez" e fala dos resultados para ela perfeitamente claros dessa análise, enquanto a minoria, pelos vistos, reeia essa análise, escudando-se unicamente nas "palavras mesquinhas". A maioria recomenda "que se tenha em conta que o nosso OC não é apenas um grupo de literatos"; a maioria "quer que à cabeça do OC estejam pessoas perfeitamente determinadas, conhecidas do congresso, que preencham as exigências de que falei" (isto é, exigências não apenas literárias, p. 327, discurso do camarada Langue). Ainda desta vez, a minoria não ousa levantar a luva e não diz nem uma única palavra sobre quem, na sua opinião, pode fazer parte de um organismo coletivo que não seja apenas literário, nem diz quem é uma pessoa "perfeitamente determinada e conhecida do congresso". A minoria continua a entricheirar-se por trás da famosa "harmonia". Mais ainda. A minoria serve-se mesmo de argumentos que são absolutamente falsos em princípio, e que por isso provocam, muito justamente, uma resposta violenta. "O congresso - vejam só - não tem o direito, nem moral nem política, de modificar a redação" (Trótski, p. 326), "é uma questão demasiado delicada (sic!)" (ibid.) "como devem comportar-se os membros não eleitos da redação perante o fato de o congresso não querer que eles façam mais parte da redação?" (Tsariov, p. 324)*4.
Tais argumentos remetiam já a questão inteiramente para o campo da piedade e do ressentimento, sendo um reconhecimento manifesto da bancarrota no terreno dos argumentos verdadeiramente de princípio, verdadeiramente políticos. E a maioria definiu imediatamente esta maneira de pôr o problema pelo seu verdadeiro nome: filistinismo (camarada Rússov). "Na boca de revolucionários - disse justamente o camarada Rússov - ouvimos singulares discursos que estão em evidente desacordo com o conceito de trabalho de partido, de ética de partido. O argumento essencial que os adversários da eleição dos grupos de três formulam reduz-se a um ponto de vista puramente filistino sobre os assuntos do partido" (todos os sublinha dos são meus)... "colocando-nos neste ponto de vista que não é de partido e sim filistino, em cada eleição iremos encontrar-nos perante a questão de saber se Petrov se não ofenderia vendo que em vez dele foi eleito Ivanov, se determinado membro do CO se não ofenderia vendo que em vez dele foi eleito outro para o CC. Camaradas, onde é que isto nos vai levar? Se nos reunimos aqui não para nos obsequiarmos mutuamente com agradáveis discursos ou trocarmos amabilidades filistinas, mas para criar um partido, não podemos de maneira nenhuma estar de acordo com esse ponto de vista. Trata-se de eleger funcionários e não pode colocar-se a questão de falta de confiança em nenhum dos não eleitos, mas apenas do bem da causa e de que a pessoa eleita seja adequada para o cargo para que é designada" (p. 325).
Aconselharíamos todos os que querem entender por si próprios as causas da cisão do partido e chegar às suas raízes no congresso que leiam e releiam o discurso do camarada Rússov, cujos argumentos a minoria não refutou, como nem sequer os pôs em dúvida. Aliás é impossível contestar verdades tão elementares e primárias, cujo esquecimento tão justamente explicou o próprio camarada Rússov só por "excitação nervosa". E para a minoria esta é efetivamente a explicação menos desagradável de como eles tinham podido abandonar o ponto de vista de partido para passar a um ponto de vista filistino e de círculo*5.
Mas a minoria estava a tal ponto impossibilitada de encontrar argumentos razoáveis e sérios contra as eleições que, para além de introduzir espírito filistino nos assuntos do partido, chegou a métodos de caráter francamente escandaloso. De fato, como não chamar assim ao método utilizado pelo camarada Popov, que aconselhou o camarada Muraviov "a não aceitar encargos delicados" (p. 322)? Que é isto senão querer "introduzir-se na consciência alheia", segundo a justa expressão do camarada Sorókine (p. 328)? Que é isto senão especular sobre "questões pessoais" à falta de argumentos políticos? Ao afirmar que "sempre protestamos contra tais meios", o camarada Sorókine tinha ou não razão? "Será admissível a conduta do camarada Deutsch, que procurou de maneira ostensiva pôr no pelourinho os camaradas que não estavam de acordo com ele?"*6 (p. 328).
Façamos o balanço dos debates sobre a questão relativa à redação. A minoria não refutou (nem tentou refutar) as numerosas indicações da maioria sobre o fato de que os delegados conheciam o projeto do grupo de três desde a abertura do congresso e antes do congresso e de que, por consequência, esse projeto se baseava em considerações e dados independentes dos acontecimentos e discussões do congresso. A minoria, ao assumir a defesa do grupo de seis, tomava uma posição inadmissível e errada quanto aos princípios baseada em considerações filistinas. A minoria mostrou ter esquecido completamente o ponto de vista de partido quanto à escolha dos funcionários, sem procurar sequer fazer uma apreciação de cada candidato para um cargo, da sua adequação ou não adequação às funções desse cargo. A minoria furtou-se ao exame da questão a fundo, invocando a famosa harmonia, "vertendo lágrimas", "tomando atitudes patéticas" (p. 327, discurso de Langue), como se "se quisesse matar" alguém. A minoria chegou mesmo a "introduzir-se na consciência alheia", a gritar que as eleições eram "criminosas", a usar de outros meios igualmente inadmissíveis, sob a influência da "excitação nervosa" (p. 325).
A luta do espírito filistino contra o espírito de partido, das "questões pessoais" do pior gosto contra as considerações políticas, das palavras mesquinhas contra os conceitos mais elementares do dever revolucionário, eis o que foi a luta à volta do grupo de seis e do grupo de três na trigésima sessao do nosso congresso.
E na 31.ª sessão, quando, por maioria de 19 votos contra 17 e três abstenções, o congresso rejeitou a proposta para confirmação do conjunto da antiga redação (ver p. 330 e a errata), e quando os antigos redatores voltaram para a sala das sessões, o camarada Mártov, na sua "declaração em nome da maioria da antiga redação" (pp. 330-33 1), deu provas, em proporções ainda maiores, das vacilações e da mesma instabilidade da posição política e das concepções políticas. Examinemos em pormenor cada um dos pontos da declaração coletiva e da minha resposta (pp. 332-333) a esta declaração.
"A partir de agora - diz o camarada Mártov depois da não confirmação da antiga redação - o velho Iskra já não existe, e seria mais lógico mudar-lhe o nome. De qualquer maneira, vemos na nova decisão do congresso uma restrição substancial do voto de confiança dado ao Iskra numa das primeiras sessoes do congresso."
O camarada Mártov, com os seus colegas, levanta uma questão, verdadeiramente interessante e instrutiva sob muitos aspectos, sobre a coerência política. Já lhe respondi ao invocar aquilo que todos tinham dito quando da confirmação do Iskra (p. 349 das atas, cf. acima, p. 82)*7. E indubitável que estamos na presença de um dos mais gritantes exemplos de falta de consequência em política. Da parte de quem? Da parte da maioria do congresso ou da maioria da antiga redação, deixamos ao leitor o cuidado de julgar. E ainda ao leitor que deixamos o cuidado de decidir de duas outras questões postas muito a propósito pelo camarada Mártov e pelos seus colegas: 1) é um ponto de vista filistino ou um ponto de vista de partido que revela o desejo de ver "uma restrição do voto de confiança ao Iskra" na decisão do congresso de proceder à eleição dos funcionários para a redação do OC? 2) a partir de que momento deixa realmente de existir o velho "Iskra" ? A partir do n.0 46, quando Plekhánov e eu começamos ambos a dirigi-lo, ou a partir do n.0 53, quando a maioria da antiga redação se colocou à cabeça dele? Se a primeira questão é uma questão de princípio das mais interessantes, pelo contrário a segunda é uma questão de fato das mais interessantes.
"Como se decidiu agora - prossegue o camarada Mártov - eleger uma redação de três pessoas, eu declaro em meu nome e em nome dos meus outros três camaradas que nenhum de nós fará parte dessa nova redação. Pela minha parte, acrescentarei que, se é exato que alguns camaradas quiseram inscrever o meu nome como um dos candidatos a esse "grupo de três", vejo-me obrigado a ver nisso uma ofensa que não merecia (sic!). Digo isto em virtude das circunstâncias em que se decidiu alterar a redação.
Decidiu-se isso por causa de certas "fricções"*8, da incapacidade para atuar da antiga redação, e o congresso resolveu essa questão num determinado sentido, sem nada perguntar à redação sobre essas fricções e sem nomear sequer uma comissão para pôr a claro isso da sua incapacidade para atuar"... (O estranho é que a ninguém da minoria ocorreu propor ao congresso que "perguntasse à redação" ou nomeasse uma comissão! Não seria porque, depois da cisão da organização do Iskra e do fracasso das conversações sobre as quais escreveram os camaradas Mártov e Starover, isso teria sido inútil?)... "Nestas circunstâncias, devo considerar a hipótese de certos camaradas de que eu aceitaria trabalhar na redação reformada desta maneira como uma mancha na minha reputação política"...*9
Foi propositadamente que reproduzi na íntegra este raciocínio, para apresentar ao leitor uma amostra e o ponto de partida do que floresceu com tanta abundância depois do congresso e que não podemos qualificar de outro modo senão como querela mesquinha. Já empreguei esta expressão na minha Carta à Redação do "Iskra" e, apesar do descontentamento da redação, sou obrigado a repeti-la pela sua exatidão incontestável. E errado crer-se que tais querelas implicam "motivos baixos" (como conclui a redação do novo lskra): qualquer revolucionário minimamente familiarizado com as nossas colónias de exilados e emigrados certamente pôde ver dezenas de exemplos destas querelas, em que se colocavam e examinavam até à sociedade as mais absurdas acusações, suspeitas, auto-acusações, questões "pessoais", etc., querelas provocadas pela "excitação nervosa" e condições de vida anormais, bafientas. Não há um só homem sensato que se ponha a procurar a todo o custo motivos baixos nestas querelas, por mais baixas que se iam as suas manifestações. E é apenas por uma "excitação nervosa" que se pode explicar esta meada emaranhada de absurdos, de questões pessoais, de horrores fantásticos, de penetrações na consciência alheia, de ofensas e de calúnias imaginárias que nos oferece o excerto que reproduzi do discurso do camarada Mártov. As condições de vida bafientas geram entre nós centenas destas querelas, e um partido político não mereceria consideração se não ousasse dar o seu verdadeiro nome à doença de que sofre, fazer um diagnóstico implacável e procurar o meio de cura.
Na medida em que se pode distinguir nesta meada algo de princípio, tem de se chegar inevitavelmente à conclusão de que "as eleições nada têm de comum com uma ofensa à reputação política", que "negar o direito do congresso de proceder a novas eleições, de introduzir qualquer modificação nos quadros de funcionários, de selecionar os componentes dos organismos aos quais outorga poderes", significa embrulhar a questão, e que "o ponto de vista do camarada Mártov segundo o qual podia eleger-se parte do antigo organismo revela uma enorme confusão de conceitos políticos" (como disse no congresso, p. 332)*10.
Omito a observação "pessoal" do camarada Mártov relativa à questão de saber quem teve a iniciativa do plano do grupo de três e passo à caracterização "política" do significado que ele deu à não confirmação da antiga redação:... "O que se passou agora é o último ato da luta que se desenrolou durante a segunda metade do congresso"... (Muito bem! e esta segunda metade começa no momento em que Mártov, a propósito do § 1 dos estatutos, caiu no apertado abraço do camarada Akímov)... "Não é segredo para ninguém que, quanto a esta reforma, não se trata de "capacidade para atuar", mas de uma luta pela influência sobre o CC"... (Em primeiro lugar, não e segredo para ninguém que se tratava tanto da capacidade para atuar como de uma divergência sobre a composição pessoal do CC, visto que o plano de "reforma" foi apresentado quando ainda não se podia falar da segunda divergência e quando, em conjunto com o camarada Mártov, tínhamos escolhido como sétimo membro da redação o camarada Pavló vitch! Em segundo lugar, já mostramos, apoiados em documentos, que se tratava da composição pessoal do CC, e que à la fin des fins *11 o problema se reduziu a uma diferença de listas: Glébov—Travínski—Popov e Glébov—Trótski—Popov)... "A maioria da redação mostrou que não queria ver transformado o CC num instrumento da redação"... (Começa a cantilena de Akimov: a questão da influência, pela qual luta qualquer maioria, em qualquer congresso de partido, sempre e em todo o lado, a fim de consolidar esta influência por uma maioria nos organismos centrais, passa para o domínio dos mexericos oportunistas sobre o "instrumento" da redação, sobre "um simples apêndice" da redação, como disse o próprio camarada Mártov um pouco mais tarde, p. 334.) ... "E por isso que foi preciso reduzir o número de membros da redação (!!). E é por isso que não posso fazer parte de tal redação"... (Vejam só com mais atenção este "e é por isso que": como poderia a redação transformar o CC num apêndice ou num instrumento? Exclusivamente no caso de ter três votos no Conselho e abusar desta superioridade? Não é claro? E não será também claro que o camarada Mártov, eleito terceiro membro, poderia sempre impedir qualquer abuso e eliminar apenas com o seu voto qualquer superioridade da redação no Conselho? A questão reduz-se, pois, precisamente, à composição pessoal do CC, e desde logo fica bem claro que isso de instrumento e apêndice são meros mexericos.)... "Em conjunto com a maioria da antiga redação, eu pensava que o congresso poria fim ao "estado de sítio" no seio do partido e instalaria nele um regime normal. Na prática, o estado de sítio com as suas leis de exceção contra certos grupos foi prolongado e até se agravou. Só se se mantiver a composição da antiga redação podemos garantir que os direitos conferidos à redação pelos estatutos não serão utilizados em prejuízo do partido"...
Esta é a passagem integral do discurso do camarada Mártov em que lançou pela primeira vez a famigerada palavra de ordem do "estado de sítio". E agora vede a minha resposta:
..."Ao corrigir a declaração de Mártov sobre o caráter particular do plano dos dois grupos de três, nem sequer penso, no entanto, em opor-me ao que o próprio Mártov diz sobre o "significado político" da iniciativa que tomamos não confirmando a antiga redação. Pelo contrário, estou inteira mente e sem restrições de acordo com o camarada Mártov em que esta decisão tem grande importância política, mas não no sentido que lhe atribui Mártov. Este é, disse ele, um ato da luta pela influência no CC na Rússia. Eu vou mais longe do que Mártov. Toda a atividade do Iskra enquanto grupo particular foi até agora uma luta pela influência, mas agora trata-se de algo mais, trata-se de consolidar organicamente esta influência e não só de lutar por ela. A profundidade da nossa divergência política com o camarada Mártov sobre este ponto manifesta-se claramente quando ele me lança à cara este desejo de exercer influência no CC, ao passo que eu me prezo de ter procurado e de continuar a procurar consolidar esta influência através da organização. Verifica-se que até falamos linguagens diferentes. De que servi ria todo o nosso trabalho, todos os nossos esforços, se viessem a ser coroados pela mesma velha luta pela influência, e não pela plena aquisição e consolidação da influência? Sim, o camarada Mártov tem toda a razão: o passo dado é incontestavelmente um grande passo político, que prova que foi escolhida uma das tendências que atualmente se nos apresentam para o trabalho futuro do nosso partido. E não estou nada assustado com as palavras terríveis sobre o "estado de sítio no Partido", sobre as "leis de exceção contra certas pessoas ou certos grupos", etc. Para os elementos instáveis e hesitantes não somente podemos, mas devemos, criar o "estado de sítio" , e os nossos estatutos na sua totalidade, todo o nosso centralismo a partir de agora aprovado pelo congresso, tudo isso mais não é do que um "estado de sítio" contra as fontes tão numerosas de imprecisão política. Contra a imprecisão necessitamos justamente de leis especiais, ainda que sejam de exceção, e o passo dado pelo congresso indicou a direção política justa, dando uma base sólida a tais leis e a tais medidas."*12
Sublinhei neste resumo do meu discurso no congresso a frase que o camarada Mártov preferiu omitir no seu "Estado de Sitio" (p. 16). Não admira que esta frase lhe tenha desagradado e que não tenha querido compreender o seu sentido bem claro.
Que significa a expressão "palavras terríveis", camarada Mártov?
Significa troçar, troçar dos que dão grandes nomes a coisas pequenas, que embrulham uma questão simples com uma fraseologia pretensiosa.
O único, pequeno e simples fato que pôde servir e serviu de pretexto à"excitação nervosa" do camarada Mártov consistia exclusivamente no fato de o camarada Mártov ter sofrido uma derrota no congresso, na questão relativa à composição pessoal dos centros, O significado político deste simples fato foi que a maioria do congresso do partido, depois de ter triunfado, consolidou a sua influência estabelecendo também a maioria na direção do partido, lançando, no terreno da organização, uma base para a luta, por meio dos estatutos, contra aquilo que essa maioria considerava hesitação, instabilidade e imprecisão*13. Falar a propósito disto de "luta pela influência" com uma espécie de horror no olhar e queixar-se do "estado de sítio" era apenas fraseologia pretensiosa, apenas palavras terríveis.
O camarada Mártov não está de acordo com isto? Porque não tenta demonstrar-nos se houve no mundo um congresso de partido, se é concebível em geral um congresso de partido em que a maioria não consolidou a influência conquistada: 1) estabelecendo a mesma maioria nos centros; 2) dando-lhe poder para neutralizar a hesitação, a instabilidade e a imprecisão?
Antes das eleições, o nosso congresso tinha de resolver a questão: era à maioria ou à minoria do partido que se devia reservar um terço dos votos no OC e no CC? O grupo de seis e a Lista do camarada Mártov significavam que o terço nos cabia a nós e os dois terços aos seus partidários. O grupo de três no OC e a nossa lista significavam que dois terços eram para nós, e um terço para os partidários do camarada Mártov. O camarada Mártov recusou-se a chegar a um acordo conosco ou a ceder, e provocou-nos para o combate, por escrito, diante do congresso; mas depois de ter sofrido a derrota perante o congresso, pôs-se a chorar e começou a queixar-se do "estado de sítio"! Ora não será isto uma querela mesquinha? Não será isto uma nova manifestação de tibieza própria de intelectuais?
Não podemos deixar de recordar a propósito a brilhante definição sociopsicológica desta última qualidade dada recentemente por K. Kautsky. Os partidos sociais-democratas de diferentes países estão atualmente sujei tos muitas vezes a doenças do mesmo gênero, e ser-nos-á muito, muito útil aprender com camaradas mais experientes o diagnóstico justo e o trata mento acertado. Por isso, a definição de alguns intelectuais dada por Kautsky só na aparência nos afastará do nosso tema.
... "No momento atual, de novo nos interessamos vivamente pela questão do antagonismo entre os intelectuais*14 e o proletariado. Os meus colegas" (Kautsky é também um intelectual, literato e redator) "em muitos casos indignar-se-ão ao ver que eu admiro este antagonismo. Mas o fato é que ele existe, e a táctica mais inadequada seria (neste como noutros casos) tentar desembaraçarmo-nos dele negando o fato. Este antagonismo é um antagonismo social que se manifesta nas classes e não em indivíduos isolados. Tal como um capitalista, um intelectual pode, individualmente, entregar-se por inteiro à luta de classe do proletariado. Em tais casos, quando isto tem lugar,o intelectual muda também de caráter. No que vou dizer a seguir, não tratarei principalmente dos intelectuais deste tipo, que ainda hoje são exceção no seio da sua classe. A seguir, quando não houver qualquer reserva especial, entendo por intelectual apenas um intelectual comum que se situa no terreno da sociedade burguesa, e que e um representante característico da intelectualidade como classe. Esta classe mantém-se num certo antagonismo com o proletariado.
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